Elmo Alves Silva é Instrutor de Hotelaria do SENAC Pelourinho há vários anos, Bacharel e Licenciado em História (UCSal), Especialista em Estudos Culturais, Histórias & Linguagens (UNIJORGE). Atualmente, é Instrutor de Ações Educativas do Museu de Gastronomia Baiana e subcoordenador de Cozinha do CEH-PEL, Palestrante e professor de história da gastronomia.
Confira a entrevista e saiba mais sobre a cozinha afro-baiana!
Cozinha FIT&FAT: Comenta um pouco sobre a origem da cozinha baiana.
Elmo Alves: Quando nós falamos da cozinha baiana eu sempre digo que nós falamos de cozinhas baianas. Nós não temos 1 cozinha típica baiana, nós temos cozinhas típicas baianas. Dentro dessas cozinhas, nós temos uma cozinha que é toda alicerçada nessa cultura no dendê. Que tem o dendê como elemento emblemático, que dá identidade. Quando eu falo da cozinha da Bahia eu falo da cozinha do Recôncavo, da Chapada, do oeste, do planalto de altitude, da caatinga, da cozinha ribeirinha do Rio São Francisco, do extremo sul da Bahia. Então, eu tenho varias cozinhas, cada uma com sua especificidade, cada uma com seus elementos, sua cultura, sua identidade. Essa cozinha do dendê ela é típica do Recôncavo baiano. Desse côncavo que circunda a Bahia de Todos os Santos, que temos: Salvador, Maragogipe, Nazaré, Cachoeira, São Félix, todas essas cidades que foram implantadas essa cultura escravocrata, do escravismo, que teve a cultura da cana de açúcar… Então, nessa cozinha nós teremos o Dendê muito presente devido a essa influência afro brasileira que é muito nítida forte e presente nela. Fora desse contexto, dessa delimitação geográfica, nós teremos outras cozinhas. Agora, nessa cozinha do Recôncavo baiano que é uma cozinha linda, rica, colorida, aromática, o dendê tem uma influência fundamental, ele nos identifica. Nós até brincamos quando dizemos que uma menina traduz a Bahia nós dizemos “ela tem dendê”. Nós que somos do recôncavo não conseguimos desassociar a cozinha baiana da cozinha do dendê. Mas eu gosto de fazer uma ressalva: As cozinhas da Bahia vão muito mais alem do que isso.
Cozinha FIT&FAT: Quais alimentos são característicos da culinária baiana?
Elmo Alves: Se a gente for definir Bahia nós vamos ter várias. Vamos ter desde a moqueca, dessa cozinha praiana, do recôncavo. Vamos ter a carne seca, a paçoca pilada. Vamos ter a cozinha ribeirinha com os peixes de rio do São Francisco. Vamos ter a cozinha orgânica da chapada, uma cozinha baseada em palma, godó de banana o arroz vermelho. Uma cozinha que devido a escassez de produto daquela região, ao clima bastante forte que não favorece o cultivo da agricultura, favorece uma culinária é baseada no que se tem, no que se pode comer, no que se pode aproveitar. A cozinha da chapada é uma comida inventiva, criativa, que temos como exemplo, o palmito de jaca entre outras preparações. Várias preparações traduzem a Bahia. Agora falar qual a comida típica baiana? É a comida do dia a dia. É a comida de “mainha”, do dia a dia, que sempre tem um feijão, seja mulatinho, fradinho, ou um arrozinho, puro ou temperado, seja um bifezinho, um franguinho de ensopado, um ensopado de carne. Que também é uma cozinha que nos traduz.
Cozinha FIT&FAT: O que representa o dendê para a região baiana?
Elmo Alves: Independente de ser Recôncavo ou Chapada, a Bahia ficou sendo conhecida por essa cozinha exótica, atrativa, colorida que tem essa religiosidade. A cozinha de um povo não é decorrente apenas da necessidade de se alimentar. Tem raízes profundas na identidade social do indivíduo. Seja religiosa, política, seja cultural. Nós não comemos só por comer nos comemos por um conjunto de fatores que permeia esse comer. O dendê, querendo ou não, essa cozinha afro baiana, que tem o dendê como alimento principal, é uma cozinha que se eternizou, se preservou, seja pela cultura do candomblé ou outros fatores, e tornou a sua culinária forte atrativa e identidária. Nós falamos em cozinha baiana, automaticamente, vem a imagem do caruru, do vatapá do abará, da moqueca. O dendê para a cozinha baiana é um elemento de suma importância que nos dá identidade. Nós temos uma ligação muito próxima com esse fruto porque ele nos traduz.
Cozinha FIT&FAT: Qual a culinária marcante das comunidades que vivem à beira do rio São Francisco?
Elmo Alves: Não podemos esquecer que o rio São Francisco é “um mundo”. Ele percorre uma grande território baiano e nordestino. Vamos ter uma culinária típica de acordo com a região geográfica do ambiente que o rio passa. Eu vou ter locais do rio São Francisco que vai ser a cozinha sertaneja, porque ele também passa pelo sertão. Que vai ter o bode o peixe pescado. Já vão ter outras regiões que tem o cultivo excessivo de frutas, os espumantes do Vale São Francisco. Temos uma culinária bem diversa quando se fala no rio São Francisco Lembrando que nos ainda não consumimos o pescado com deveríamos consumir. Eu não sei o porquê existe um certo preconceito ou não existe uma prática ou porque o rio está tão deteriorado, depredado… Mas ainda não consumimos esse pescado com bastante intensidade, que deveríamos valorizar.
Cozinha FIT&FAT: Qual a culinária que representa o sertão baiano?
Elmo Alves: Por incrível que pareça, a cozinha sertaneja é a cozinha do nosso dia a dia. A gente come muita carne seca, muito guisado, muito legumes, muita maxixada, muita quiababa. O que nós ainda na consumimos é o bode. Não sei o porquê nós ainda temos o preconceito com a carne do caprino. Que é uma carne maravilhosa, magra, saborosa. Sendo bem feita ela é uma iguaria sim. Primoroza. Nós ainda não temos uma aceitação muito grande com o bode. Mas, a culinária do sertão é a culinária quase que do dia a dia. Até porque quando falamos em cozinha do sertão a gente está falando de uma comida típica nordestina. É uma cozinha que entrelaça as relações entre todos os estados do nordeste. Você pode vir da Bahia Sergipe Fortleza, você vai ter uma coinha muito próxima: As mandiocas, as raízes, o grão.
Cozinha FIT&FAT: E qual a culinária do extremo sul da Bahia?
Elmo Alves: No extremo sul da Bahia, vamos nos reportar automaticamente a Porto Seguro e regiões próximas. Vamos ter a chamada cozinha praiana, muito voltada para o mar, muitos pescados e frutos do mar e também produtos cultivados. Que algum momento ela vai se assemelhar com outras culinárias, nós teremos muitas preparações de moquecas, guisados, ensopados, mariscados. A culinária do extremo sul é uma cozinha extremamente diversificada, bem eclética. Até porque Porto Seguro é uma cidade turística.
Cozinha FIT&FAT: Avançando em direção aos estados de Minas Gerais e Goiás, o que encontramos no prato do baianos?
Elmo Alves: Aí já vamos ter uma cozinha nordestina se aproximando para essa região do centro oeste, que é do cerrado, de altitude… Se você for à cidade de Barreiras, por exemplo, você vai ver uma outra cozinha completamente diferente. Se você for à cidade de Luis Eduardo Magalhães, você vai levar até um choque. Porque você vai ver que a cultura do churrasco é muito forte. Lá você vai encontrar Pequi e outras preparações que se assemelham muito com as práticas alimentares de Brasília, Goiás e do Tocantins. A gente vai ter uma outra Bahia. Por isso que eu defendo que nós não temos uma cozinha típica baiana e sim cozinhas típicas baianas. Porque a cozinha é feita de absolvições, de diálogos sociais e retrata a cultura material de um povo. A cozinha típica é definida por vários aspectos e um deles é o geográfico. São os recursos naturais disponíveis. Se eu moro no cerrado eu vou ter as frutas do cerrado na minha dieta. Se eu moro no litoral, eu vou ter os peixes e frutos do mar na minha dieta. O meio geográfico vai dizer muito o que eu consumo e a minha prática com o alimento.
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